ENTREVISTA

Angola acompanha com atenção nova proposta de lei de imigração de Portugal - PR

Presidente João Lourenço - Augusto Santos
Presidente João LourençoImagem: Augusto Santos

23/07/2025 10h47

Luanda - O Presidente República, João Lourenço, afirmou, esta terça-feira, que Angola está a acompanhar com atenção a nova proposta de lei de imigração de Portugal, apesar de ainda não ter feito declarações públicas sobre o assunto.

Em entrevista exclusiva à CNN Portugal, João Lourenço referiu-se a questão no quadro das relações bilaterais e da dinâmica interna da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), e sublinhou que o assunto tem gerado inquietação, sobretudo após o Brasil ter sido o primeiro país a manifestar o seu descontentamento.

“Os países são soberanos, têm as suas políticas de imigração. Cada um só recebe na sua casa quem quer. Ninguém pode impor isso. Mas, também não se deve fugir muito daquilo que é a prática internacional”, enfatizou o estadista angolano.

João Lourenço destacou que Portugal é historicamente um país de emigração e que, por essa razão, não deve esquecer o modo como os seus cidadãos foram acolhidos em várias partes do mundo.

“O passado de Portugal está muito ligado à emigração. Foram para a Europa, para a América Latina, para África. O mínimo que se exige é que Portugal não trate os imigrantes que escolheram o país como destino de forma pior do que foram tratados os portugueses nos países que os acolheram”, referiu.

Questionado sobre se o tema será abordado durante a sua visita a Portugal, nos próximos dias, João Lourenço confirmou que vai fazer parte das conversas com as autoridades portuguesas.

“Penso que sim. Não apenas porque Angola tem imigrantes em Portugal, mas também porque, na minha condição de Presidente em exercício da União Africana, sinto que devo falar pelos africanos em geral”, afirmou, apontando que há muitos cidadãos africanos de diferentes nacionalidades a viverem em Portugal.

Na entrevista, o Presidente angolano abordou outras questões relacionadas com a CPLP, a sua sucessão, em 2027, o incentivo às empresas portguesas para investirem em Angola, os actos de vandalismo nas manifestações em Angola, os processos em curso de combate à corrupção, os poucos investimentos da Europa em África, entre outras.

No contexto da CPLP, João Lourenço defendeu que a livre circulação de pessoas deve ser um pilar essencial da comunidade e os Estados-membros da organização devem continuar a trabalhar para evitar retrocessos.

O Presidente em exercício da União Africana, Joao Lourenço, afirmou que a comunidade internacional deve ter mais coragem para condenar todos os que contribuem, de forma negativa, para a desestabilização de África.

Sublinhou que Angola pauta a sua conduta por manter boas relações com todos os países do mundo, defendendo que se deve para ter mais coragem para apontar, condenar todos os que contribuem, de forma negativa, para a paz no continente africano.

Sobre a próxima Cimeira União Europeia-África, a realizar-se, a 25 de Novembro próximo, em Luanda, disse que a mesma vai servir para consolidar a relação e perspectivar o futuro entre os dois continentes, realçando que vai ser uma boa oportunidade para alicerçar aquilo que foi ganho, por ambas as partes, ao longo dos anos.

Disse que a Europa deve procurar tirar o maior proveito possível das relações que tem com o continente, por estar numa posição privilegiada e conhecer muito bem África, tendo reconhecido que o continente europeu poderia ter feito muito mais em benefício de ambos os lados.

Sublinhou que África precisa de atingir um outro nível de desenvolvimento, de investir bastante em infra-estruturas, estradas, portos, caminhos-de-ferro, infra-estruturas de produção e distribuição de energia, podendo contar muito mais com a Europa.

Em resposta a uma outra questão da CNN, João Lourenço afirmou que as autoridades angolanas "fizeram muito mais", ao longo dos 50 anos de independência nacional do país, do que o regime colonial português, em 500 anos.

Na entrevista, o estadista angolano abordou os feitos da independência, da cooperação com Portugal, do investimento norte-americano em Angola, da situação política mundial, entre outros pontos.

Nos 50 anos, enfatizou, foram desenvolvidas acções em praticamente todos os domínios, desde infra-estruturas, rede de estradas, produção e distribuição de energia, número de escolas e de alunos, quantidade e qualidade de alunos, entre outros.

Questionado sobre quando poderão ter lugar as eleições autárquicas, disse ter sido por sua iniciativa que o tema foi levantado numa reunião do Conselho da República, recordando que, apesar de a Constituição de então já fazer referência as mesmas, não existiam grandes pressões para que o processo se desenvolvesse.

Reconheceu que nesta altura o processo enfrenta algum impasse no Parlamento, defendendo que só existirão condições para o Presidente dar continuidade ao assunto quando for ultrapassado o impasse que se verifica, no sentido da aprovação do Pacote Legislativo Autárquico.

O Presidente angolano reiterou que as alegações de perseguição política em Angola, envolvendo Isabel dos Santos e outros, perdem força, dado que outros países, como Portugal e Holanda, também conduzem investigações.

Sublinhou que a justiça tem actuando independentemente de quaisquer considerações políticas, realçando não haver indícios de que as acções judiciais em Portugal e Holanda sejam motivadas por perseguição política, e salientou que a questão central reside na apuração da conduta, independentemente das relações familiares.

Defendeu que a presunção de inocência deve ser sempre mantida, aferindo que o foco deve estar na investigação das acusações, não na relação familiar do indivíduo.

João Lourenço reafirmou que o direito à manifestação em Angola está consagrado na Constituição e deve ser respeitado, dentro dos marcos da lei, referindo que, em relação aos recentes protestos registados no país, particularmente em Luanda, se deve fazer distinção entre o protesto pacífico e os actos que configuram infracções criminais.

“O direito à manifestação está previsto na nossa Constituição e na Lei. Agora, se um cidadão queima viaturas, vandaliza contentores do lixo ou destrói bens públicos e privados, isso já não é manifestação, isso é crime. E como crime, deve ser tratado nos termos da lei”, sublinhou.

O Presidente sublinhou a importância de se continuar a dialogar com a juventude, trazendo esta nova geração para o lado da esperança, num contexto de consolidação da democracia e do Estado de direito.

Por outro lado, incentivou as empresas portuguesas a apostarem mais no investimento nos sectores industrial, agro-pecuário e das pescas, em Angola, em detrimento do simples comércio.

Reconheceu que já há algumas empresas portuguesas que, durante muitos anos, se limitaram à comercialização de produtos no mercado angolano, que agora estão a produzir localmente, tendo montado fábricas e a dar emprego a cidadãos angolanos.

A concluir, João Lourenço manifestou o desejo de que o seu sucessor, em 2027, seja jovem, mas devidamente preparado para assumir as responsabilidades da governação de Angola.

Revelou que reflecte diariamente sobre a sua sucessão, sublinhando que o país não pode ser entregue a qualquer pessoa.

“Não seria verdade dizer que não penso. Tenho de pensar, é meu dever, porque não podemos deixar que o país fique nas mãos de um qualquer”, afirmou, sublinhando ser sua obrigação contribuir para a identificação de um sucessor à altura, embora reconheça que essa escolha não depende apenas da sua vontade, apesar de se encontrar em melhores condições para orientar o processo.

Acrescentou que se sentiria, de certa forma, responsabilizado, caso o futuro dirigente não correspondesse aos princípios e valores do MPLA, às normas do Estado e à Constituição da República de Angola.

“Farei tudo para ajudar a encontrar alguém que faça por Angola, no mínimo, o mesmo que eu fiz nestes anos de mandato ou, de preferência, melhor”, reforçou.

Recorde-se que João Lourenço assumiu a Presidência da República, em 2017, sucedendo a José Eduardo dos Santos, na sequência da vitória do MPLA nas eleições gerais.

Em 2022, o MPLA voltou a ganhar as eleições, reconduzindo João Lourenço ao segundo e último mandato como Presidente da República.

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